terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

Montanhas russas

Há quase uma semana que sinto que estou numa montanha russa, cheia de altos e baixos.
Foi tudo tão fácil contigo, Doc.

Dos dias passados em telefonemas apressados com amigos da Tashi e veterinários, das noites apertadas sem dormir, ou a dormir muito depressa para chegar na manhã seguinte rápido ao Hospital, do trabalho que continuo a marcar sem parar porque não quero dar-me esse tempo, muito pouco fica. Ficam os momentos com ela. Ficam as dores da cada notícia má e a euforia de cada pequena vitória.

A Tashi está internada há quase 7 dias. Das preocupações e ansiedades das primeiras sessões de quimioterapia veio uma infeção oportunista, que me tirou o chão, que nos tirou a calma necessária para enfrentar um monstro deste tamanho.

Vi-a a desfalecer. Levei-a em braços para o Hospital. Estóica, a minha cadela perfeita não deu sinais nenhuns. Valeu-me o olho treinado e a intuição de que ela não estava bem, dentro do mais-ou-menos que estavam a ser os seus dias.

A dor da ausência por causa de uma viagem de trabalho antes do seu internamento. A angústia de a deixar por algo que preparava há meses para NÓS. As memórias daquele fim de semana de caminhada, em que as suas corridas me despertaram uma gargalhada e decidi filmar algo que andava há anos para filmar. Sempre a dizer: para a próxima. Quem diria que a próxima não ia chegar? Quem me poderia ter avisado que o meu cão perfeito, a minha companheira de alma, poderia estar, silenciosamente, heroicamente, a desenvolver algo nela? Onde estava o meu olho clínico então?

Dizem que o luto tem várias fases... Pois eu ainda não fiz o luto e já as passei a todas, várias vezes. a rejeição, a raiva, a tristeza profunda. A única coisa comum a todas as fases, sabem que mais? A dor no peito, tão enorme que não seria capaz de descrever, nem por escrito.

Sou extrovertida, partilho tudo. Nestas coisas, partilho a informação, escondo sempre o que sinto. Excepto quando me escorrem as lágrimas pela cara descontroladamente quando atendo um cliente. E aí sinto que preciso de ter tempo e espaço, e que não consigo, por vinte-e-um mil motivos que agora não interessam nada. Porque o tempo já passou e há CONSTANTEMENTE decisões a ser tomadas. E ela não fala. Não fala comigo, e por mais que lhe peça, não pode decidir.

O medo. O medo das decisões erradas.
A perda é nada quando comparada com este enorme medo. Este gigante que habita em mim nos momentos angustiantes com os (meus) seres. Deixá-la ir parece-me perfeito. Parece-me o fim de algo, e isso neste momento soa bem. Porque tudo é melhor do que este remoinho de vento em que não se tem tempo para comer nem para respirar, não se pára para sentir, e não se consegue sonhar.

Os sonhos, de uma outra vida.
Tão pouco, este tempo, que tivemos.

Tantos aqueles que ajudaste, que não consigo ver justiça nisto. Tantas pessoas, tantos cães. É preciso contar? Meu cão perfeito.

Quantas vezes terei que me despedir de ti?
Todos os dias, quando te visito pela última vez e te massacro, seja com comida forçada ou a limpar-te os pelos, quando me suplicas com o olhar para voltar para casa e te tenho que negar, me despeço de ti. Como se fosse a última vez. Todas as manhã, percorro os escasso kms a pensar no que vou ouvir, quantas vezes já imaginei o "aguarde um bocadinho" seguido de uma entrada para um qualquer gabinete para me explicarem que terias partido. Quantas marcas isto deixa em mim, e quantos momentos de euforia aparecem de seguida quando te vejo a aparecer, cauda de abanar tímido, ou me mandam entrar para te encontrar deitada e me cumprimentares com um levantar de cabeça ligeiro?
Qual o certo, qual o errado?

Tomei todas as decisões, todas foram acertadas porque segui a intuição e o coração, escorados por opiniões clínicas sustentadas. E então, porque sinto esta dor?

Mufo meu, espera por mim. Que decidirei sempre e arcarei com o peso da decisão por ti. Contigo.


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